Megaeventos no Brasil: oportunidades e desafios da copa do mundo FIFA 2014 para o Sistema Único de Saúde

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Mega-events: opportunities and challenges of the 2014 FIFA world cup for Brazil’s Unified National Health System (SUS)

Adriano Massuda

Diretor da Secretaria Executiva do Ministério da Saúde
Coordenador da Câmara Temática de Saúde da Copa do Mundo FIFA 2014

Endereço para correspondência
Adriano Massuda
Ministério da Saúde. Esplanada dos Ministérios, BI. “G” 3º andar sala 305
70058-900 – Brasília, DF – Brasil
E-mail: [email protected]

Recebido em 16/06/2012
Aceito em 03/07/2012

O Brasil entrou definitivamente na agenda dos megaeventos mundiais com a realização da Copa do Mundo FIFA 2014 e dos Jogos Olímpicos e Paraolímpicos Rio 2016.

Sediar grandes eventos traz inúmeros desafios, mas é uma das melhores oportunidades que um país tem para organizar a casa e, esperando receber visitas, apresentar ao mundo seu povo e sua história, sua cultura, suas belezas naturais, conquistas e lutas sociais que poderão ser demonstradas para centenas de milhares de pessoas que se deslocarem ao país ou que acompanharem o evento pelos meios de comunicação. A Alemanha e a África do Sul são exemplos de países que souberam aproveitar a Copa para transmitir mensagens ao mundo com temas como “É hora de fazer amigos” e “Diga não ao racismo”, respectivamente.

Ao mesmo tempo, a preparação para a realização de megaeventos pode induzir o desenvolvimento econômico e social, seja por meio da geração de empregos e renda, seja abrindo portas para iniciativas de qualificação profissional e de melhorias na prestação de serviços públicos e privados. É também um momento em que as cidades podem aproveitar para se revitalizarem e se modernizarem nas áreas da gestão pública, infraestrutura e urbanismo. Nesse caso, Barcelona é referência de cidade que soube se reinventar utilizando-se da preparação para os Jogos Olímpicos.

Para o setor saúde, megaeventos também apresentam desafios e oportunidades. O aumento do fluxo de pessoas e a aglomeração populacional trazem um conjunto de riscos e ameaças para a saúde coletiva. Há incremento da carga de atendimentos na rede de serviços de urgência e emergência, principalmente por causas externas associadas ao abuso de álcool e drogas; e variação do perfil epidemiológico, por meio da importação de agentes infecciosos de outras regiões do mundo ou do próprio país. Grandes eventos com alta visibilidade de mídia também podem ser alvo de atentados terroristas, com uso de materiais biológicos, químicos e nucleares. Requerem, portanto, ações articuladas de preparação, prevenção e resposta entre setores de segurança pública, defesa civil e saúde1.

Enfrentar os desafios que megaeventos trazem, buscando oferecer segurança sanitária aos turistas e à população em geral, pode servir como canal para investir na formação dos profissionais e na qualificação de serviços de saúde na área de urgência e emergência, bem como para implementar tecnologias de informação e comunicação em saúde para monitoramento e resposta a situações de emergência de saúde pública: benefícios que podem ficar como legados permanentes para a organização do sistema de saúde2,3.

Com vistas a coordenar a preparação do Sistema Único de Saúde (SUS) nas 12 cidades-sede para a COPA do Mundo FIFA 2014, o Governo Federal, por meio de ação conjunta entre os Ministérios da Saúde e do Esporte instalou, em maio de 2011, a Câmara Temática de Saúde. O objetivo da Câmara é promover a articulação das três esferas de governos, definir diretrizes organizacionais, projetos estratégicos, responsabilidades e metas a serem atingidas, além de acompanhar a execução das ações preparatórias para o mundial. Essa instância também visa a reconhecer oportunidades de desenvolvimento das ações de saúde associadas à Copa que possam ficar como legados para o país.

O plano de ação de Saúde para a Copa prevê ações de apoio à estruturação da Rede de Atenção à Saúde de Urgência e fortalecimento do Sistema de Vigilância em Saúde, bem como ações específicas para o grande evento. Para essas, tem-se utilizado como referência o Toolkit da OMS (Organização Mundial da Saúde), que descreve os elementos considerados básicos para a preparação e execução das ações desenvolvidas pela saúde para eventos de massa, dividindo a preparação em ações pré-evento, durante o Evento e pós-evento, conforme síntese descrita no Quadro 1.

 

O apoio à estruturação da rede de serviços nas 12 cidades-sede seguirá as diretrizes da Política Nacional de Urgência, que tem por finalidade articular e integrar todos os equipamentos de saúde objetivando ampliar e qualificar o acesso humanizado e integral aos usuários em situação de urgência nos serviços de saúde, de forma ágil e oportuna. Dentre os investimentos contemplados na Rede de Urgência estão ambulâncias do SAMU, Unidades de Pronto Atendimento (UPA), leitos de UTI e de retaguarda em hospitais de referência, salas de estabilização em Unidades Básicas de Saúde, bem como Centrais de Regulação de Urgência, inscritas dentro de uma lógica territorial4.

Além disso, hospitais das cidades-sede da Copa foram contemplados no programa SOS Emergência, em que será realizada readequação física e tecnológica dos hospitais; aprimoramento da gestão nas unidades de urgência e emergência; implementação de acolhimento com avaliação de risco; protocolos e linhas de cuidado nas áreas de traumatologia (TRAUMA), síndrome coronariana aguda (SCA) e acidente vascular encefálico (AVE); bem como garantir e organizar a retaguarda de leitos para os hospitais. Esses hospitais serão referência para atendimento aos turistas durante a Copa, conforme o mapa apresentado (Figura 1).

 

Figura 1 Hospitais do SOS Emergência nas cidades-sede da Copa

As cidades-sede de Copa também serão priorizadas em iniciativas voltadas para formação de profissionais da área da saúde, em cursos organizados pelos hospitais de excelência por meio do Programa de Apoio ao Desenvolvimento Institucional do Sistema Único de Saúde (PROADI-SUS). Estão previstas a formação de médicos e de enfermeiros e técnicos de enfermagem para implementação de protocolo de atendimento pré-hospitalar e hospitalar em SCA, AVE e TRAUMA e em emergências cardiovasculares.

As áreas de Vigilância em Saúde das 12 cidades-sede também serão priorizadas com ações estruturantes voltadas para atender às normas e exigências do Regulamento Sanitário Internacional. Estão previstos planos para desenvolvimento de capacidades básicas de vigilância sanitária nos pontos de entrada do país (portos, aeroportos e fronteiras) e intensificação das ações de vigilância em estabelecimentos e infraestrutura de interesse sanitário. Além disso, será utilizada a Rede CIEVS (Centro de Informações Estratégicas em Vigilância em Saúde), para elaboração de planos de preparação e resposta a possíveis emergências em saúde pública, bem como preparação de ações de comunicação de risco referentes às doenças transmissíveis de relevância epidemiológica nas regiões que receberão jogos e regiões turísticas próximas. Os Centros compreendem: 27 Secretarias de Estado de Saúde; 26 Secretarias Municipais de Saúde; 27 Laboratórios de respostas rápidas; 2 Laboratórios em municípios estratégicos e 2 Laboratórios em municípios de fronteira.

A Rede CIEVS dispõe dos mais modernos recursos tecnológicos para receber informações sobre a ocorrência de surtos e emergências epidemiológicas que coloquem em risco a saúde da população em qualquer local do país. Conta com unidades em todos os estados e capitais do país, bem como laboratórios de fronteira e em municípios estratégicos (Figura 2).

 

Figura 2 Rede CIEVS (Centro de Informações Estratégicas em Vigilância em Saúde) no Brasil

A preparação das cidades-sedes para a Copa também contará com eventos-teste e simulados para lidar com a gestão de emergências e desastres. Nesse ponto, a Força Nacional do Sistema Único de Saúde (FN-SUS) criada recentemente para prestar assistência rápida e efetiva às populações em situações de catástrofes, epidemias, ou crises assistenciais, também poderá ser mobilizada durante o evento5,6.

Todos os investimentos que serão realizados para estruturar a Rede de Urgência e o Sistema de Vigilância em Saúde seguirão as orientações das políticas nacionais de saúde, configurando-se, portanto, como investimentos necessários para a determinada região de saúde, e que em função da Copa serão priorizados, ficando como legado permanente para o SUS e para a população brasileira.

Por fim, a realização de megaeventos esportivos também traz oportunidades para reforçar ações de incentivo à população brasileira da prática de atividades físicas, do lazer e da promoção da saúde, tão importantes no contexto de incremento das doenças crônico-degenerativas associadas ao sedentarismo e a hábitos de vida pouco saudáveis. Nesse sentido, tem se trabalhado em parceira com a FIFA e o Comitê Organizador Local da Copa em ações focadas no público escolar e adulto, reforçando políticas públicas intersetoriais dos Ministérios da Saúde, Educação e Esporte, como exemplo o “Saúde na Escola”, a “Academia da Saúde” e o “Programa Esporte e Lazer na Comunidade”.

Palavras-chave: Sistema Único de Saúde; Megaeventos; Vigilância em Saúde; Rede de Atenção à Saúde

Keywords: Public Health System; Mega-events; Health surveillance; Healthcare network

 

REFERÊNCIAS

1. Carmo EH, Penna G, Oliveira WK. Emergências de saúde pública: conceito, caracterização, preparação e resposta. Estud av., São Paulo. 2008;22(64):19-32.

2. Memish ZA, Stephens GM, Steffen R, Ahmed QA. Emergence of medicine for mass gatherings: lessons from the Hajj. Lancet Infect Dis. 2012;12(1):56-65.

3. Organización Mundial de La Salud. Reglamento sanitario internacional (RSI 2005): 2a ed. Organización Mundial de la Salud: Ginebra; 2008.

4. Brasil. Ministério da Saúde. Gabinete do Ministro. Portaria nº 1.600/GM/MS, de 07 julho de 2011. Reformula a Política de Atenção às Urgências e institui a Rede de Atenção às Urgências no Sistema Único de Saúde (SUS).

5. Brasil. Presidência da República. Decreto nº 7.616, de 17 de novembro de 2011. Dispõe sobre a declaração de Emergência em Saúde Pública de Importância Nacional – ESPIN e institui a Força Nacional do Sistema Único de Saúde – FN-SUS.

6. Brasil. Ministério da Saúde. Gabinete do Ministro. Portaria nº 2.952/GM/MS, de 14 de dezembro de 2011. Regulamenta no âmbito do Sistema Único de Saúde (SUS), o Decreto 7.616 de 17/11/2011.

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